Resenha: Doutor Octopus – Origem, muito além dos 4 tentáculos.


“Dr. Octopus: Não parece correto, parece? Estarmos frente
a frente, porém destituídos de nossas invenções,
desnudos em nossa frágil humanidade.
Somos horrendos, não somos?
Homem-Aranha: Não, a gente não é.”


Edição BR pela Panini
Olá, pessoal! Hoje é dia de resenha de quadrinhos, e a bola da vez é Doutor Octopus – Origem (Doctor Octopus: Year One).

Para mim, Octopus sempre foi um dos vilões mais legais da galeria do Aranha. Muitas vezes subestimado ou mal aproveitado, Otto é um gênio da mecânica, robótica e cibernética. Seus tentáculos fornecem alcance, superforça, capacidade de locomoção e escalada. Mas não é apenas por isso que eu gosto do Doutor. A personalidade megalomaníaca e arrogante dele, quando bem escrita, é muito interessante.

Não de motivos para seu filho se tornar um supervilão
Em Origem, acompanhamos a formação da personalidade de Otto Octavius, desde a infância até seu encontro com o “Amigão da vizinhança”. Otto era uma criança gênio que, como todo bom CDF, sofria a perseguição dos valentões da escola enquanto, em casa, convivia com um pai agressivo e violento. Crescendo nesse meio, Otto viu a ciência como sua única saída e se dedicou totalmente à ela.

Adentrando em uma das melhores instituições de ensino superior dos Estados Unidos, apesar de ainda ser vítima de algum preconceito por ser o estereótipo do nerd (baixinho, gordinho, de óculos, enfurnado em livros... praticamente eu), Otto se concentrou ainda mais em seus estudos. Encontrando apoio de um grupo de professores, dedicou-se a desvendar os segredos do átomo e da radiação, o que acabou despertando o interesse militar por suas pesquisas.

Uma das capas originais. Poderia ser
um batutinha, não?
Contudo, na mesma medida em que cresce o intelecto, cresce a arrogância do cientista, fazendo com que ele veja seus colegas como obstáculos incapazes de acompanhá-lo e auxiliá-lo em seu progresso. Isso leva ao desenvolvimento dos tentáculos, à integração deles com o próprio Otto e ao acidente que acaba por fundi-los ao seu corpo. Nasce o Doutor Octopus.

Não vou dar mais spoilers pra não estragar a leitura de quem se interessar pelo encadernado. Contudo, tenho que dizer que gostei bastante dessa releitura da origem desse vilão que ganhou bastante espaço recentemente. O Doutor Octopus andou muito tempo na zona nublada entre o heroísmo e a vilania. O roteiro de Zeb Wells serve pra demonstrar os motivos pelos quais Otto se torna obcecado pelo Aranha, não apenas como inimigo, mas com o ideal de superá-lo, de ser melhor que o aracnídeo, o que serve de enlace com a recente Homem-Aranha Superior (motivo de críticas e elogios), onde um Otto moribundo transfere sua mente para o corpo do Aranha, com o objetivo de ser um herói melhor que seu outrora inimigo.

As capas são lindas. A arte de Kaare Andrews é divertida, limpa, com traços mais simples, algumas vezes quase caricato (o que pode incomodar alguns), mas que casam muito bem com o contraste das cores de José Vilarrubia.

Por fim, os encontros entre Peter Parker e Otto Octavius e entre Homem-Aranha e Doutor Octopus chegam a ser quase poéticos pela narrativa visual. Gostei bastante.

Octopus "loucão" no cinema

WELL, Zeb. Dr. Octopus - Origem. trad. Fernando Bertacchini - 1a. ed. - Barueri: Panini Books, 2014.
Capa dura. Colorida. 124 pg.
Preço de Capa: R$ 21,90.

Projeto Relendo Sandman – A introdução!



"Sonhe! Sonhos mudam
o mundo todas as noites!"


Sandman
Claro que você, como pessoa bem informada, conhece Sandman, certo? Mas, para aqueles que ainda não foram apresentados à esta maravilha, vou fazer uma introdução.

No final dos anos 80, os ingleses invadiram os quadrinhos americanos, trazendo com eles histórias com uma temática mais adulta e fora do padrão que preenchia o mercado. Um desses ingleses foi Neil Gaiman, que já recebeu um post aqui no blog.

Neil Gaiman adentrou a DC Comics e, após algumas controvérsias ao trabalhar em selos de heróis mais populares, recebeu de Karen Berger a proposta de repaginar um herói da era de ouro que já caía no esquecimento: um justiceiro encarnado por um milionário chamado Wesley Dodds que, para punir criminosos, utilizava uma máscara e uma pistola de gás do sono (sim, as pessoas eram muito criativas naquela época). Sem outros poderes, confiando apenas na arma que lhe permitia adormecer os criminosos, Dodds passou a utilizar a alcunha de Sandman, entidade mitológica que trazia o sono, atirando areia nos olhos das pessoas. (Sabe aquela remela que encontramos nos olhos ao acordar? Eles achavam que eram restos da areia do Sandman). Em alguns lugares do Brasil, em especial aqueles em que a cultura portuguesa se difundiu, esse mito recebe o nome de João Pestana.

Titio Gaiman
Bom, voltando ao Gaiman, a DC deu carta branca pra ele fazer o que quisesse com Sandman, e aí a coisa ficou linda! O cara reformulou totalmente o personagem. Sandman não era mais humano, ele era Mopheus, Moldador, Oneiros... era a personalização da própria capacidade humana de sonhar. Ele havia sido aprisionado por humanos durante décadas e sua falta foi tamanha, que a própria realidade procurava maneiras de compensar (uma delas, gerando o próprio Wesley Dodds, uma personificação humana, daquilo que o universo havia perdido temporariamente).

Não vou entrar mais em detalhes. Esse post de hoje inaugura o Projeto Relendo Sandman. Vou tentar resenhar, comentar e discutir com vocês (se possível uma vez por semana) cada uma das edições de Sandman. Assim podemos trocar idéias e discutir os pontos mais legais de uma das histórias em quadrinhos mais cultuadas pela galera nerd. Claro, alguns posts provavelmente terão spoilers, então é legal que você leia a edição antes (a menos que você não se importe com isso).

Essa tem na minha estante
A minha coleção é aquela Sandman: Edição Definitiva, lançada pela Panini em encadernados enormes (mas não tão enormes quanto os americanos). Você encontra outras versões por aí, já que os direitos de publicação de Sandman passaram de mão em mão pelas editoras aqui no Brasil. Outro recurso são os scans (eu mesmo li Sandman, pela primeira vez, através deles).

Minha dica: LEIA! E leia com calma!

Sandman vale muito a pena.

Pra dar uma contextualizada e você entrar no clima, vamos apenas falar sobre os Perpétuos, pra você entender quem é Morpheus. Claro que essa é a minha visão sobre eles, mas acho que está bem alicerçada com aquilo que vamos descobrindo no decorrer das histórias.

Imagine a existência. Deve ter algum motivo pra isso tudo, não é? Mesmo que nós ainda não saibamos qual seja. Partindo desse pressuposto, se considerarmos que o universo foi criado por uma entidade maior, minimamente consciente do que estava fazendo, ela tinha um objetivo ao promover “a criação”. Esse “objetivo” adentrou o próprio universo, assumindo o nome de Destino, que encerra em si (e em seu livro), a própria finalidade da existência. 

Destino é um sujeito pálido, cego, sempre coberto por um manto marrom como pergaminhos muito antigos. Acorrentado ao seu braço está o Livro, onde o próprio universo, o tempo e o espaço estão escritos. Só destino, mesmo cego, é capaz de ler o livro, embora raramente possa interferir.

Se o próprio universo tem uma finalidade, um Destino, um dia essa finalidade será alcançada. Esse ponto final, esse fim de todas as coisas também se tornou um aspecto da existência: Morte, ou seja, a necessidade de que aquilo que existe um dia chegue ao fim. 

Além disso, havia a necessidade de que o Universo se renovasse. Nesse intervalo entre a criação e o final, a matéria que compunha a realidade se renovaria infinitas vezes, mas para se renovar, ela precisava ser destruída. Surge o terceiro aspecto perpétuo da existência: Destruição. 

Atrelada à destruição, havia a necessidade de renovação, de criação, do aproveitamento daquilo que restava das primeiras coisas quando estas eram destruídas. Essa força criativa infinita e perpétua assume o aspecto de Sonho, a capacidade de criar, renovar, imaginar. 

Até esse momento, os perpétuos representavam as necessidades básicas da realidade: Destino, Morte, Destruíção e Sonho (renovação). Esses são os grandes perpétuos, os irmãos mais velhos. Contudo, a existência, conforme o plano descrito no livro do Destino, levaria ao surgimento de seres vivos e, com eles, os instintos básicos. Primeiro, o querer, movido pelas necessidades mais primordiais de sobrevivência e, à medida que a vida adquiria racionalidade, às emoções e aos sentimentos. Quando essas necessidades e sentimentos não eram atendidos, aparecia a frustração. Surgem, então, os gêmeos Desejo e Desespero.

Por fim, a mais nova dos Perpétuos representava a satisfação, o prazer de alcançar essas realizações, a própria felicidade em si, e foi chamada Deleite. Contudo, conforme o universo evoluiu, coisas aconteceram e uma grande tragédia tornou Deleite em Delirium, a personificação da loucura e do caos que atinge a existência.

Esses, então, são os Perpétuos, entidades acima dos deuses, relacionadas às forças fundamentais da existência.

A família reunida

Curiosamente, no original, todos tem os nomes iniciados pela letra D (Destiny, Death, Destruction, Dream, Desire, Despair, Delirium). Por isso, em versões mais antigas, chegamos a encontrar os Perpétuos nomeados como Destino, Desencarnação, Destruição, Devaneio, Desejo, Desespero e Delírio.


Agora que você já conhece a família, semana que vem nós conheceremos formalmente Sonho e acompanharemos o início de sua jornada.

Bem-vindos à Sandman!

Resenha: O diário de Anne Frank (Finalmente!!!)

 


“Espero poder contar tudo a você, 
como nunca pude contar a ninguém, e espero
que você seja uma grande fonte de conforto e ajuda.”

Alguns posts (e mais de um mês atrás), eu disse que estava topando o desafio literário da Rory Gilmore, ou, ao menos, tentando. Bom, O diário de Anne Frank é o meu primeiro livro integrante do desafio e tenho que dizer: É um livro incrível.

Na verdade, O diário de Anne Frank é bem mais que isso. Ele é um relato real de uma jovem retirada de seu cotidiano normal por uma guerra injustificada, privada de sua liberdade e forçada a conviver em tempo integral com seus familiares e alguns estranhos, enquanto se escondem da opressão alemã durante a Segunda Guerra Mundial.

Anne nasceu em 1929, na Alemanha. Aos 4 anos, com a ascensão do partido nazista, sua família se retirou para a Holanda, onde foi alcançada pela Segunda Guerra Mundial em 1942. Contando com o auxílio de conhecidos, o pai de Anne, Otto Frank, providenciou um alojamento sobre uma fábrica de especiarias, um anexo secreto oculto atrás de uma estante, acima do espaço da fábrica e seus escritórios. Neste pequeno esconderijo, Anne, seu pai, sua mãe e irmã e outras quatro pessoas conviveram durante dois anos, afastados do mundo exterior. Em 1944, contudo, o “Anexo secreto” foi descoberto e deportados. O pai de Anne, último sobrevivente da família, recebeu o diário após o fim do conflito e decidiu realizar o sonho de Anne, que ambicionava ser escritora, publicando o livro.

Há, dentre várias, duas considerações essenciais sobre o livro. Primeiro, ele é um relato fiel, em primeira mão, das agruras da guerra e, mais que isso, da dificuldade dos inocentes em lidar com a crueldade humana. Nesses dois anos vividos dentro do anexo, acompanhamos as tristezas, esperanças e incertezas que acometem aquelas pessoas escondidas durante tanto tempo. Os contrastes entre as diferentes personalidades, as preocupações com o mundo exterior, o medo sempre constante de serem encontrados. Essa é o primeiro aspecto do diário: um documento histórico que narra a guerra a partir do ponto de vista das vítimas.

A segunda das considerações é sobre o amadurecimento da autora. No início do diário, Anne tem 13 anos. Dada à devida contextualização histórica, ela ainda é uma menina imatura, até mesmo fútil em alguns momentos, quando retirada de uma vida relativamente confortável e transportada para o cenário recluso e isolado do anexo. Contudo, Anne é espirituosa, dotada de um humor e uma sensibilidade extraordinários, o que, aliados à sua fé inabalável, permite que acompanhemos, através das páginas, o desenvolvimento de uma personalidade forte, um caráter honrado e uma crença gigantesca na bondade humana.

A menina que começa o livro não é a mesma que encontramos nas últimas páginas. Tanto a escrita, quanto os temas narrados e o seu ponto de vista sobre eles vão se tornando cada vez mais complexos e desenvolvidos graças, muitas vezes, apenas à percepção sensível de Anne sobre as pessoas e acontecimentos em sua vida. Anne Frank nos mostra que existem duas maneiras de se lidar com o sofrimento: entregar-se à ele ou utilizá-lo como força e experiência para o nosso próprio amadurecimento.

Trata-se de uma leitura recomendadíssima que, com certeza, merece um lugar na nossa estante.



FRANK, Anne. O diário de Anne Frank – edição definitiva por Otto Frank e Mirjam Pressler. trad. Ivanir Alves Calado. - 22a. ed. - Rio de Janeiro: BestBolso, 2013.
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